quinta-feira, 7 de fevereiro de 2013

Sonhos recorrentes

Você sonha muito?

          Um dos mistérios mais antigos relativos ao ser humano é a sua capacidade de sonhar. É bem provável que os homens mais primitivos ficassem confusos quanto a realidade. É possível que se perguntassem se as imagens vistas durante o sono eram reais ou se estavam acordados. Ou ainda se teriam sido levados a outro lugar.  Assim, o sonho por muito tempo ocupou o lugar místico de uma revelação dos deuses. Um sinal enigmático a ser considerado nas decisões humanas.  Por não se tratar de algo produzido voluntariamente, o homem, em sua busca pelo sobrenatural, utilizou-se ao longo dos tempos de indutores de estados alucinatórios, como as ervas, de modo a “invocar” a resposta dos deuses. Alucinação... Sonho... são a mesma coisa?
         Desde a antiguidade os filósofos  também se ocupavam com os sonhos. Para Platão e Pitágoras, os sonhos revelavam a verdade sobre a alma. Aristóteles afirmava que os sonhos eram a expressão da vida anímica durante o sono, um fenômeno relacionado com os órgãos internos, podendo indicar como as doenças se desenvolviam. Descartes propõe a dúvida da realidade no estado desperto em relação àquela do sonho. Schopenhauer, também estudando a diferenciação entre o sonho e o estado desperto, concluiu que o único critério que distingue a diferença é o ato de despertar e que a formação dos sonhos se devia a alguma excitação fisiológica partindo de dentro do organismo.
        Com os avanços da ciência sobre a atividade cerebral, descobrimos que durante o ciclo sono-vigília existem fases para o descanso, as fases do sono.  E que a atividade onírica (sonho) ocorre na fase mais profunda do sono, a fase REM, devido a intensa atividade neuronal  do cérebro. Esta atividade coincidia com o relato de sonhos pelos voluntários estudados. Mas o mecanismo desencadeador do sonho permanecia desconhecido.
          Friedrich Nietzsche, filósofo do século XIX, afirmava que o sonho significava o retorno às condições mais remotas da cultura humana, através de uma atividade mental que  ocorreria de forma desapercebida, indicando a existência de alguma atividade inconsciente. Para ele, significava a busca das razões para a excitação do sistema nervoso. O sonho seria a apresentação das razões.
       Por volta do final do século XIX e inicio do século XX, as descobertas do Dr. Sigmund Freud sobre o funcionamento psíquico o levaram a construção de um corpo teórico  o qual tornou-se mundialmente conhecido como ‘Psicanálise’.  Dentre seus estudos, Freud construiu uma teoria sobre os sonhos. Em 1900 sua obra ‘A Interpretação dos Sonhos’ tornou-se um marco nos estudos sobre atividades oníricas.  Para Freud os sonhos são manifestações de energias psíquicas reprimidas durante o estado de vigília. São necessidades primárias e desejos que não encontram expressão na ação consciente.  Assim negados, tais impulsos geram tensão no aparelho psíquico e procuram por outras formas de expressão. Os sonhos constituem-se numa das formas de expressão dos desejos reprimidos.  Os símbolos utilizados nos sonhos são imagens da memória articuladas entre si pelo inconsciente que Freud nomeou ‘conteúdos manifestos’. Estes necessitariam ser interpretados de modo a desvendar o ‘conteúdo latente’ nele existente, ou seja, qual era o desejo expresso. Desta forma, um critério inconsciente determinaria símbolos/imagens a serem utilizados pelo sonho, de modo a driblar a censura consciente.
     Carl Jung, um dos discípulos de Freud, discordava de seu mestre, dentre outros aspectos, sobre a intepretação da linguagem simbólica. Para ele a psique não distingue conteúdos manifesto e latente. A energia psíquica se serve de conteúdos da memória e do ‘inconsciente coletivo’ para expressar-se.  Ou seja, os símbolos representam aquilo que necessariamente querem expressar.  Jung desenvolveu também um corpo teórico, a Psicologia Analítica, onde explica a existência de uma instancia do inconsciente inerente a todos os humanos de forma atemporal chamada ‘inconsciente coletivo’, dentre outras descobertas acerca da alma humana.
         Sonhar é algo inerente a nós, seres humanos. Como vimos, os sonhos são expressões da alma, do nosso interior.  Assim, são considerados importante instrumento na psicoterapia de base psicanalítica ou Junguiana.

         Se você tem tido sonhos recorrentes (sempre os mesmo símbolos), pesadelos, sonha quase todas as noites, isto pode significar um pedido de socorro.  Atente para si mesmo. Procure ajuda profissional.

Referencias:
Freud,  S. Conferências introdutórias sobre psicanálise, parte I e II, vol. XV. Ed. Imago, 2006.
Garcia-Roza, L. A. Introdução à metapsicologia freudiana. A Interpretação do sonho

(1900), vol. 2. Ed. Jorge Zahar, 1991.

Kast, V. Sonhos: a linguagem enigmática do inconsciente. Ed. Vozes, 2010.